Desde muito nova, o teatro surgiu para mim quase como uma forma de terapia. Cresci em um ambiente onde as apresentações teatrais eram raras, então a televisão se tornou uma janela para ver as grandes atrizes. Lembro de assistir com minha avó e sentir uma vontade de estar lá. Eu comecei no teatro com uma peça chamada Do Amor, que escrevi e que me abriu muitas portas. Depois, veio a peça INKUBUS, que também virou um livro — relançado recentemente. O teatro sempre foi um espaço de descoberta, onde eu podia experimentar diferentes possibilidades. Depois, quando comecei a fazer meus primeiros testes e a lidar com as rejeições, descobri o roteiro como uma forma de criar minhas próprias histórias, para que eu pudesse atuar. Foi assim que surgiu SEPTO, a websérie que criei com amigos muito talentosos de minha cidade natal. Foi um marco não só para a minha carreira, mas também para os olhares voltados ao Nordeste no audiovisual. A recepção que tivemos foi um grande marco, alcançando festivais e ganhando visibilidade internacional.
Olha, na minha infância, acho que as primeiras referências foram mais musicais mesmo, principalmente influenciada pelo meu avô, que é um cara apaixonado por música, um professor de geografia, cartografia temática, um humanista. Um cara que, através das músicas, sei lá, de Chico Buarque — não esqueço nunca de ouvir O Sambista com ele, interpretando as músicas do disco e me explicando por que Chico falava "chame ladrão" e não "chame a polícia", e falando sobre a ditadura. Lembro dele me apresentar Zeca Baleiro, Chico César; lembro de ouvir muito Fagner com ele e Elba Ramalho e ser impactada no trajeto para a escola. Ele tinha uma dinâmica de ouvir a música e pausar o CD dentro do carro para explicar o trecho. Acho que isso foi muito marcante nesse período da minha infância, até mesmo quando eu estava começando a fazer teatro. Essa coisa da interpretação do texto e a conexão com as palavras, eu trouxe muito dele. Já na adolescência, acho que foi o lance de ser apresentada à performance arte. E aí os primeiros nomes que me vêm à cabeça são o Grupo Cena 11, teatro performativo, e também o Fuerza Bruta, essa coisa da fisicalidade. Acho que eu tinha uns 14 anos quando comecei a entender. E claro, Marina Abramovic. A partir disso, entrei na Faculdade de Artes Visuais, e ter essa formação em artes plásticas trouxe uma outra camada para as minhas criações cênicas enquanto atriz, diretora, dramaturga. E reverberam em mim até hoje. E, claro, telenovela.
Acredito que o teatro segue sendo, apesar da popularização escalonada do audiovisual através dos streamings, uma antena potente e bem afiada do que os grupos subalternizados desejam para o Brasil presente-futuro. O Nordeste ainda está longe de ter uma representação diversa e fidedigna de sua cultura, fora dos estereótipos, assim como a região Norte, mas seguimos caminhando. Essas mudanças de visão proporcionam, aos poucos, a quebra de uma cadeia arquetípica equivocada e também uma ampliação de oportunidades de emprego para nós. Sigamos, porque a estrada ainda é longa e de barro.
Quase diariamente. Acho que lidar com isso é me mover para frente, seguir em movimento, mesmo que o medo queira me paralisar. Acho que essas "fintas" diante da auto-sabotagem é o que conheço como coragem.
Cada papel exige um mergulho em um universo, o que me força a desconstruir, a cada novo trabalho, as ideias e as emoções que carrego. É como uma reeducação emocional. Eu gosto de estudar bastante o contexto da história, entender a psicologia do personagem e me preparar fisicamente. Não tenho um processo rígido, começo pelo texto e deixo que ele me guie. A partir daí, vou criando camadas e ajustando conforme as demandas da direção e da obra. É um trabalho muito colaborativo e intuitivo, e a consistência vem justamente desse compromisso com o que é verdadeiro em cada personagem.
BaianaSystem, Dusouto, Luísa e os Alquimistas, Rosa de Pedra, Coruja BC1, BK, Drik Barbosa, N.I.N.A., Djonga (meu grande amor), Vandal, Khrystal, Juliana Linhares, Zé Ramalho, Cátia de França, Josyara... Ultimamente tenho estado em lua de mel com Liniker. Além disso, Pitty e Emicida, que tive o privilégio de dirigir e roteirizar o projeto audiovisual Travessia, que nos uniu.
Abandono os cadernos de processo/estudo e vou para a rua observar as pessoas. Quase infalível. Quando não tem jeito, durmo. Todo dia é um novo dia.
Eloquência é responsabilidade. O artista não pode estar apartado do espírito do momento, nem das lutas de seu povo. Um artista alienado pode até entregar o belo vazio, mas não tem aura. Quero sempre tentar ter aura no que faço, estudando, ouvindo e me colocando à disposição de Brasis mais justos.
Não me afetam as possibilidades de "perda de espaço" ou "críticas degradantes" por causa das minhas convicções políticas ou do meu "ativismo". Realmente tanto faz.
“Conquistar o mundo, viver de nada, virar fantasma”, de um trabalho de videoperformance de Manuela Libman e Maria Clara Contrucci.